Compliance como ferramenta de excelência em compras públicas
No primeiro texto desta série trouxemos o caso de uma empresa fornecedora do governo que implementou o programa de Compliance.
O exemplo reforça um comportamento comum de empresas que possuem como princípio a crença em um processo de compras públicas ético e transparente.
No entanto, ainda existem muitas dúvidas sobre a relação formada entre o programa de integridade e as licitações no Brasil.
E não é difícil encontrar licitantes pelo nosso país que se questionam sobre o programa de Compliance. Indagando qual a necessidade de adotá-lo ou qual a sua relevância nas contratações públicas.
Neste artigo veremos então mais detalhadamente a importância do Compliance, abordando principalmente, pela perspectiva do fornecedor, o uso do Compliance como ferramenta de excelência nas compras públicas.
Antes de tudo, o que é o Compliance?
No texto anterior já havíamos expressado que o Compliance é uma ferramenta para o gerenciamento de todo ciclo de ações de negócios, onde cada decisão corporativa pode fazer a diferença.
No entanto, quando falamos de uma ferramenta tão crucial, que atinge toda a jornada dentro de uma empresa, precisamos também significá-la. Designar a real importância de sua implementação.
Michelle Gimael Pires é gerente de licitações e negócios públicos e foi uma dos quatorze palestrantes que subiram ao palco do Effecti Experience 2019. Sua palestra abordava justamente o Compliance sob a ótica dos fornecedores, elucidando seu significado e função.
O significado do Compliance
De acordo com Michelle, o Compliance no ambiente corporativo significa estar em conformidade com as leis e regulamentos internos e externos à organização.
Porém, muito além disso, ele busca a consonância com os princípios da empresa, onde a ética, a moral, a transparência e a honestidade são bases para a condução dos negócios e no comportamento dos colaboradores, parceiros e fornecedores.
Nas vendas para o Governo, (e aí entram os licitantes) o principal papel do Compliance é o combate à corrupção. Os inúmeros casos que revelaram a associação entre as más práticas e as compras públicas comprovam a sua utilidade.
E foi principalmente em virtude destes escândalos e com o advento da Lei 12.846/2013 (que veremos com mais profundidade no próximo texto desta série), que a implementação do Programa de Integridade passou a ser vista como algo tão benéfico.
De fato, esta foi uma premissa desenvolvida ao longo do diálogo da advogada e gerente de licitações Michelle Pires no Effecti Experience 2019.
“Os benefícios de um programa de Compliance são inúmeros e vão além da garantia de boa imagem e reputação de mercado. Na verdade, ele representa um bônus para a empresa, uma vez que condutas corretas transmitem ao mercado uma mensagem de segurança e previsibilidade, o que facilita as negociações.”
O Compliance e as licitações
A Lei Geral de Licitações e Contratos (8.666/93) foi elaborada visando também evitar possíveis irregularidades nos contratos firmados entre a Administração Pública e as instituições privadas.
Entretanto, como bem sabemos, com o decorrer do tempo a mesma não se mostrou imune à corrupção. Com os casos revelados se constatou que os envolvidos encontraram diversas formas de driblar a lei e obter vantagens ilícitas nos contratos firmados com o governo, gerando inúmeros prejuízos a população e aos cofres públicos.
Adentrando a esse ponto, podemos afirmar que o processo licitatório apresenta três importantes momentos nos quais podem ocorrer casos de corrupção:
- Na fase interna – com o direcionamento do edital, por exemplo.
- Na formação de conluio entre as empresas concorrentes maleficiando o propósito da licitação.
- E na fase de execução contratual.
Entendido isto, como a palestrante Michelle bem apontou, devemos lembrar que a licitação não é uma ferramenta de controle de atuação administrativa. Ela é um meio técnico jurídico para a seleção e contratação de determinado serviço ou objeto por parte do governo.
Para não sobrecarregar a função da licitação é preciso encontrar um equilíbrio de melhoria no controle interno de quem promove a licitação, com a implementação de controles, medições, treinamento, auditorias, ouvidoria e controladorias permanentes.
Enquanto na Administração Privada tal melhoria se daria com a implementação de Programas de Integridade. Eles orientariam a organização ao se adotar uma postura cada vez mais transparente, lícita, ética e íntegra nos negócios firmados.
O Compliance como ferramenta de excelência
Até agora já definimos o que é o Compliance e avançamos ressaltando o seu significado, tanto para a administração pública como para a privada. No entanto ainda pode restar a dúvida:
O Compliance é uma ferramenta de excelência em compras públicas?
Ou:
Minha empresa precisa – ou vai precisar – implementar o programa de Compliance?
Bom, se você fornecedor ainda não acredita que o Compliance é uma ferramenta de excelência nas contratações públicas saiba de alguns órgãos não só acreditam como passaram a exigi-lo em suas contratações.
Exemplos disso são os Governos do Estado do Rio de Janeiro e do Distrito Federal.
Tais órgãos possuem leis estaduais que exigem que todas as empresas com contratos vigentes ou com a intenção de participar dos editais públicos de serviços e produtos possuam um Programa de Integridade, o Compliance.
Cada lei possui as suas especificidades, porém elas partilham do mesmo intuito e objetivos.
O intuito é, além de legítimo, primordial. Proteger a Administração Pública de eventuais atos lesivos que possam resultar em prejuízos financeiros causados por irregularidades, desvios de ética e de conduta e fraudes contratuais, garantindo a execução dos contratos em conformidade com a lei.
Os objetivos da exigência da implantação do Programa de Integridade são quatro, sendo eles:
1 – proteger a administração pública estadual dos atos lesivos que resultem em prejuízos financeiros causados por irregularidades, desvios de ética e de conduta e fraudes contratuais;
2 – garantir a execução dos contratos em conformidade com a Lei e regulamentos pertinentes a cada atividade contratada;
3 – reduzir os riscos inerentes aos contratos, provendo maior segurança e transparência na sua consecução;
4 – e obter melhores desempenhos e garantir a qualidade nas relações contratuais.
A ideia de tornar o Compliance uma ferramenta de excelência nas compras públicas vem no sentido de utilizar o procedimento licitatório como um instrumento de regulação e fomento às atividades social e economicamente estratégicas para o desenvolvimento nacional sustentável.
Ou seja, empresas éticas (e as que comprovam isso) serão beneficiadas em negociações que estão deixando para trás a ideia de se buscar apenas a vantagem econômica nas compras públicas.
O futuro do Compliance
Para quem ainda não sabe se essa “tendência” perdurará ou não, a Michelle também falou sobre o futuro do Compliance em sua palestra.
Na Nova Lei de Licitações (PL 1292/1995), o Programa de Integridade – Compliance, passa a ser requisito para as empresas licitantes.
Conforme o art. 24 da PL, nas contratações de obras, serviços e fornecimentos de grande vulto, o edital deverá prever a obrigatoriedade neste sentido.
Ao contrário do que muitos pensam, o Compliance não é só bom para a Administração. Os Programas de Integridade protegem também as empresas privadas e seus dirigentes.
Em sua participação no Effecti Experience, Michelle Gimael Pires atestou que a implementação do Compliance vai além do custo empregado, representando na verdade um grande investimento.